quinta-feira, 17 de dezembro de 2009

Dos Amores - 17/12/09

Na estratégia de viver doce, quando a sina é amarga,
Tenho conhecido - sem tocar - muitos amores.
A distância é proposital:
Garante o bem estar de não vislumbrar certos olhos e desvendar outras verdades.

Desses amores, não sei quantos dizem que me amam;
Que me querem pra vida inteira;
Que pensam em mim;
Que querem sugar até a última gota dos fluidos que vazam do meu corpo, natural ou mecanicamente;
Que cada dia sem mim, sem minhas palavras, sem minhas promessas, é um dia de morte,
Que querem meu cheiro, minha pele, meu sorriso, minha identidade visual,
Ainda que NUNCA tenham me visto em sua frente.
O pior: eu acredito como uma criança nos braços de sua mãe!

Com outros, já me deparei:
Presenciei soluços de um choro desesperado, tentando expulsar a solidão - nossa gêmea univitelina.
Curei dores e doenças incuráveis como um messias milagroso.
Fui pai, mãe, irmão, uma família inteira. E fui amante!
Tornei-me avalista, consultor, psicólogo, engenheiro. E tornei-me gerente!
Açoitei, desprezei, ofendi, surrei, torturei. E mostrei o sádico em mim.
Salvei almas.

Mas sofri segregações terríveis.
Suportei gestos de recusa a sangue frio,
Olhares de não maquilados de sim,
Desculpas famigeradas. Desencontros. Sumiços.
Supliquei que ficassem comigo, mas partiram em busca de seu desejo egoísta.
EGOísmo? Essência da natureza humana.

Uma cratera, sendo aberta no campo da ética e da moral,
Revelou que somos a continuação de uma procissão cega rumo ao precipício,
Onde, mortos, conviveremos melhor, porque nos faltará a fala. Porque não teremos a ação.

Após essa saga, tive de situar - tal como fui orientado - muitos deles, na periferia da minha vida.
Mas tenho um medo avassalador:
São tantos ordinários que já estão lá, formando uma legião sem face, sem id e sem ânsia
Que corro o risco de ficar só aqui no centro, derramando as lágrimas de sangue de um santo negro e desprezado.

Neste centro,
Ainda está você: criatura estranha aos olhos de todos,
mas que a mim tanto apetece.
Você, que não virtualizei um segundo de contato sequer.
Você, a quem sufoquei com meus carinhos e cuidados.
Você, que estava à mercê do próprio azar - já que sua vida não conheceu a sorte,
E eu resgatei, para um brilho de luz que acabou por te cegar,
Para um abrigo de amizade e proteção,
Para uma concha, cuja acústica esfacelou seu tímpano,
Para uma altar, onde a adoração fez-te enchergar-me IMACULADO.

Adriano Gustavo di Andrade