sexta-feira, 9 de julho de 2010

Vazio de deus - 09/07/2010

Na mesa, onde não se alimenta nada senão a nescilidade humana,
Estendo minhas mãos, examino-as, esfrego os olhos por não aceitar o que vejo e,
Quando recobro a visão, são as mesmas pedras desenhando a rota que um condenado traçou.

Sem o cigarro incendiador do câncer e da imaginação,
Sem o fermentado que me tiraria a sensação do peso,
Sem, ao menos, uma xícara de café a me enganar o amargo real,
Estou estacado. Aliás, crucifixado na prateleira de uma biblioteca deserta.

O que eu poderia ter dentro dessa bagagem, cujo uso não tem sido outro senão o do atendimento escravo aos prazeres e ao sustento?

Nem canto mais.
A música vazou pelos instrumentos todos e não entrou na sintonia fina do meu futuro.

Aliás, no meio do acorde que me esfacelaria o corpo,
Entrou um deus abandonado, quando ainda era criança, e começou a me questionar viscissitudes.
Dei-lhe um peteleco e ordenei que procurasse sua mãe.
Ele me respondeu com um olhar de vidro - tal brilho confuso - que não tinha mãe, pai nem ninguem...
Disse-me que era o início de tudo e que, por ter sido esquecido, embora adorado, só poderia nos ensinar a dor.

Sua entrevista comigo tinha o intento de que eu lhe provesse algo além de seu Universo.
Mas como poderia?
Meu corpo não foi renovado...
A musa que me escalpelaria vivo, quando fitou-me os olhos, declarou:

Deus de dor,
Este profano pagão é meu filho!

Vítima da solidariedade da mulher, segui cego por uma estrada enfeitada com códigos de restrição.

Já perdido em minha própria hibernação,
Libertei um infeliz desgraçado da brincadeira com as outras crianças,
porque suas mãos não sangravam e era requisito mínimo - para integrar a ciranda -
Que a marca da dor estivesse expressa.

No centro do estudo estávamos eu e ele.

Bêbados, intrusos e gerentes estavam todos despidos, mas assumiram a sua posição.

Exausto e solto de volta ao dia-a-dia,
Entreguei os pontos e o meu corpo.

Os livros permaneceram comigo,
Guardados onde vocês não conseguirão me furtar,

Mas acalmai-vos, aos poucos lhes revelo.


Adriano Gustavo di Andrade